A intervenção eleitoreira de Temer no Rio é apenas uma
peça de um quebra-cabeça que vai além do que mostra a mídia
As últimas ações do
(des)governo Temer, em
intervir na área de Segurança do Rio de Janeiro, criando mais um ministério, o
da Segurança Pública, e estabelecendo uma, não mais cortina, mas manta espessa
de fumaça para alterar o foco do
noticiário, desemboca, agora, na busca pela “plena censura”.
Apesar de enroscado
na Justiça, Temer mantém a agenda de desmandos em todos os setores da Política
Nacional. Engana-se quem acredita que o presidente esteja mais tranquilo após o
arquivamento das duas denúncias, por corrupção passiva, obstrução à Justiça e
formação de organização criminosa, arquivadas pela Câmara no ano passado.
Imagem: QUADRINSTA (@Quadrinsta no Instagram e no Twitter) |
O presidente e sua
equipe andam mais pragmáticos do que nunca. Só nos últimos meses, conseguiram
emplacar a contrarreforma trabalhista e, mais recentemente, a intervenção sem
plano de ação no Rio, após o insucesso, por falta de votos, na aprovação da
contrarreforma da Previdência. Isso, que todos estes movimentos são apenas os
que estampam as manchetes dos jornais e ganham evidência na mídia tradicional.
Porque do outro
lado, aquele menos noticiado, o (des)governo
tem utilizado insistentemente da censura, instrumento que a turma dita
"liberal" - uma das maiores contrariedades envolvendo o termo –
sempre recorre.
Desde que Temer
assumiu, empresas públicas de comunicação e universidades públicas sofrem com
ataques diretos, intervencionistas, de personagens incomodados com o
posicionamento e projetos que não são ligados, na maioria dos casos, a uma
pauta partidária, mas à democracia, ao Estado Democrático de Direito através da
Liberdade de Expressão.
Entre os mais
atingidos, a Empresa Brasileira de
Comunicação, a EBC, criada ainda no
governo Lula, em 2007, com o objetivo de ser um grupo de comunicação público
que, apesar de mantido pelo Estado, não manteria laços governamentais – ou
seja, imparcial e sem relações com o governo vigente – prezando pela liberdade
de criação na linha editorial. Esteve assim até 2016,quando a ex-presidente
Dilma, desesperada pelo então iminente impeachment, começou a intervir com mais
frequência no grupo, causando protestos, e o (des)governo Temer assumiu e com
ele a necessidade, quase que irrefreável e instantânea – pouco mais de 15 dias
após assumir à Presidência em definitivo, em agosto de 2016 - , de alterar a
direção e pontos do estatuto do grupo. Aliás, um dos pontos modificados foi o
que previa veto a alteração do diretor-geral pela Presidência da República sem
motivação clara como infração legal ou decisão do Conselho Curador, e, claro,
por escolha do funcionário. A modificação autorizou Temer a alterar a direção e
o Conselho.
Por Medida
Provisória, o presidente trocou o diretor-presidente da época, Ricardo Pereira
de Melo, que ocupava o cargo desde maio daquele mesmo ano, por Laerte de Lima
Rimoli, que presidiu a empresa até novembro do ano passado, quando fez piadas
com o comentário da atriz Taís Araújo de que a “cor do meu filho [de Taís Araújo] faz com que as pessoas mudem de calçada”, em uma palestra sobre
racismo. Para o lugar dele, Carlos Clemente teve o aval da Presidência de Temer
e da bancada evangélica na Câmara.
Desde então, a
empresa, não diferente de outras públicas, vem passando por sucateamento, com o
não pagamento de salários dos funcionários e, principalmente, cerceamento à
Liberdade de Expressão. O imbróglio envolvendo o ex-diretor-presidente Laerte
de Lima e a postagem racista (reproduzo abaixo) é exemplo disso. À época, houve
resistência do (des)governo em exonera-lo, que ocorreu somente após pressão da
opinião pública nas redes sociais. Laerte saiu pela porta da frente e está
residindo em Miami, nos EUA.
Outro momento que
evidencia o lado – não surpreendente para o cronista – autoritário, censurador
e manipulador do (des)governo Temer foi quando o ator Pedro Cardoso, pai do
“Agostinho Carrara” dos tempos de A
Grande Família, esteve no programa Sem
Censura, até 2016 de qualidade inquestionável, da TV Brasil, emissora do grupo EBC.
O ator foi convidado para participar do programa no dia em que funcionários da
empresa, com salários atrasados e em processo de demissões em série, promoviam
uma greve também pedindo o afastamento de Laerte de Lima por conta do episódio
já comentado neste artigo. Pedro Cardoso participou do programa de maneira
antológica: comentou sua indignação com o sucateamento da EBC e deixou o programa ainda no ar, negando-se a ficar até o final
(vídeo abaixo).
Vídeo: Reprodução / Canal "Jornalistas Livres", no Youtube
Mais recentemente,
ainda envolvendo a EBC, o editor
Décio Trujilo, gerente da Agência Brasil em São Paulo, foi demitido por ter
publicado uma reportagem que teria desagradado integrantes da Agência Nacional de Águas, a ANA, e o secretário de Recursos Hídricos
do estado de São Paulo, Bendito Braga. Tudo isso aconteceu porque a EBC firmou contrato, de 1,8 milhão de
reais, com a Agência para cobrir o Fórum Mundial da Água, que será realizado
agora em março em Brasília.
Num claro desvio de
função, já que a empresa existe para a comunicação pública e não institucional,
a cobertura pela EBC do Fórum Mundial
da Água ainda registra casos de repórteres negando-se a produzir reportagens sobre
o tema exatamente porque a empresa não é comercial.
Paralelo aos
ataques, por vezes depreciados pelos grandes meios de comunicação que se negam
a discuti-los, ainda vimos a ordem (des)governamental instaurada em 2016 não
impor-se contra os casos de artistas sendo coagidos e conduzidos a prestar
depoimentos na Justiça, e exposições censuradas sob a justificativa de
“boicote”. Além de empresas de comunicação, o (des)governo acirrou seu estilo censor também – e principalmente
– nas universidades públicas. No caso
mais recente, a disciplina “Golpe de 2016
e o futuro da democracia no Brasil”, ministrada de maneira optativa –
alunos não são obrigados a acompanhar o curso - pela Universidade de Brasília,
gerou reação do (des)governo, na figura do ministro de Educação Mendonça Filho
(DEM-PE).
Apesar de apoiada
pelo conselho acadêmico da universidade e avalizada pelo instrumento
constitucional da autonomia universitária, a disciplina está sendo alvo de
análise da Advocacia-Geral da União, do Ministério Público Federal e Tribunal
de Contas da União sob o argumento de que estaria sendo usada para fins de
“doutrinação partidária”, segundo o ministro Mendonça Filho.
Ora, convenhamos
que assim como na proposta intitulada de “Escola Sem Partido”, se considerarmos
a posição dos nobres “liberais” de que estudar ou aprofundar temas seria
“doutrinação”, deixar de estudar ou aprofundar qualquer assunto, segundo a
ótica da turma que aprecia a censura, também o seria. A diferença estaria na
posição ideológica ou partidária a ser defendida.
Imagem: QUADRINSTA (@Quadrinsta no Instagram e no Twitter) |
Os ataques não
param na censura. Mendonça Filho (DEM-PE), que está vai deixar o cargo para
focar nas eleições, ainda promoveu inúmeras demissões sob o “achismo” envolta
da tal “doutrinação”. O último caso envolve seis servidores da Fundação Joaquim Nabuco, a Fundaj, no Recife, afastados após a
visita do ministro. Os servidores tinham promovido uma comemoração usando copos
descartáveis com a inscrição “Fora Temer”, e este teria sido o estopim para a
demissão dos funcionários do Museu do Homem do Nordeste, subordinado à fundação
e ao Ministério da Educação.
O Executivo do
(des)governo Temer e seus ministros também são seguidos de perto pelo
Legislativo, com o Congresso Nacional, e no Poder Judiciário, por meio do
Tribunal Superior Eleitoral, o TSE. As últimas semanas deixaram claro que a
censura está para vir por meio de mecanismos ditos de combate as chamadas fakes news – notícias falsas.
O Tribunal Superior
Eleitoral, agora presidido pelo ministro do STF Luiz Fux - aquele que tem uma
filha desembargadora no TRF-2, no Rio, sem muita experiência no ramo do
Direito, que ganha auxílio-moradia apesar de ser dona de dois apartamentos no
Leblon, bairro nobre carioca -, já demonstrou disposição de combater notícias
falsas, só que com a imprensa – que, apesar de toda a apuração ou
comprometimento com a veracidade, itens que ela defende como antídoto para as fakes news, também carrega uma ideologia
em sua linha editorial - sendo “parceira,
nossa fonte [para o TSE] primária em uma das nossas maiores
preocupações que é o combate às fake News”.
Isso, depois que o
ministro já tinha falado no discurso de posse que “notícias falsas, fake
news, derretem candidaturas legítimas. Uma campanha limpa se faz com a
divulgação de virtudes de um candidato sobre o outro, e não com a difusão de
atributos negativos pessoais que atingem irresponsavelmente uma candidatura”, baseando a campanha, para ele,
apenas em elogios, um verdadeiro mundo de “contos de fada”. Para ele, combater fakes news é reduzir a informação,
esconder fatos que não se enquadram como “divulgação
de virtudes” durante a campanha eleitoral, que é o que lhe compete enquanto
chefe do órgão que a organiza, e não o que seria mais efetivo como estabelecer
regulações para o uso indiscriminado de mecanismo como os de
“impulsionamentos”, que promove de maneira desproporcional publicações nas
redes sociais, por candidatos políticos.
No Congresso, o projeto é ainda mais ambicioso. Presidente do
Senado, senador Eunício Oliveira (MDB-CE) – o índio nas planilhas da Odebrecht – colocou na pauta dos
próximos dias a dita proposta de combate as fakes
news, que prevê prisão para quem produzir ou compartilhar notícias que
serão consideradas falsas por um ente obscuro não presente na medida dos
senadores que, ainda, poderá pedir a exclusão do conteúdo das redes sem a
necessidade de decisão judicial, assim como retratação. Ou seja, caberá ao
establishment político, caso aprovada a proposta, a prerrogativa de definir o
que é ou não fake news.
“Passando a perna” em estudiosos, pessoas que passam horas
debruçadas sobre o tema em todo o mundo sem ainda terem chegado a uma definição,
nossos congressistas conseguiram definir, para o projeto de Lei, o que seria fake news. Na minuta do projeto, “notícias falsa, para os efeitos da Lei,o
texto não ficcional que, de forma intencional e deliberada, considerada a forma
e as características da sua veiculação, tenha o potencial de ludibriar o
receptor quanto à veracidade do fato.”
De certo modo
destratado pela mídia, todo este resumo aconteceu – e acontece - nestes dois
anos de (des)governo Temer e precisa de debate. A homogeneidade da mídia, seja
agora com Temer ou durante os governos petistas e, lá atrás, também com os
tucanos, condiciona suas manchetes e seus debates a cotas de publicidade
governamental. Numa lógica de fácil entendimento: quanto maior o repasse maior
também é, talvez não o apoio, mas a conivência com determinadas pautas, a mídia
de massa no Brasil dita o que é bom não para o País, mas para o bem-estar de
seus proprietários e, em alguns casos, utilizando-o como laboratório para a
implantação de ideais que cegamente acredita.
Nós também temos os
nossos ideais. Não tenho culpa se os nossos são por igualdade e justiça, e o
deles mostram-se, cada vez mais, pela perpetuação de um sistema que valoriza
determinados grupos em detrimento da maioria.
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